Mineração no alvo da diversidade e inclusão

Foto: SHUTTERSTOCK

A percepção da importância de um ambiente mais inclusivo tem se intensificado na indústria da mineração. Incontáveis estudos já comprovaram que equipes diversas são mais criativas e alcançam melhores resultados; e as companhias que as estimulam têm um clima organizacional mais favorável e constatam uma diminuição da rotatividade de colaboradores. É fato: a diversidade impacta a imagem corporativa – e gera lucro.

Fomentando avanços na área, o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) lançou a Carta de Compromisso do Setor Mineral, um documento que estabelece novos propósitos voluntários para a indústria minerária, com metas mensuráveis e reportáveis.

O material apresenta ações para tornar a prática efetiva:

• Encorajar as mineradoras a viabilizarem ambientes que valorizem a diversidade e promovam a inclusão, de modo que os profissionais possam
desenvolver seu pleno potencial e as empresas possam atrair, reter e desenvolver pessoas;

• Incentivar as empresas do setor a tornar o ambiente da mineração mais diverso e inclusivo, com ações afirmativas para valorização de identidades, notadamente no que diz respeito a gênero, etnia, LGBTQI+, PcDs, refugiados e povos tradicionais;

• Estimular o setor a preparar o ambiente interno para acolher Diversidade & Inclusão.

Na carta, o instituto reconhece que “o respeito à diversidade é condição primária para que se estabeleça a inclusão social com garantias ao exercício da cidadania. Ao reconhecer o direito igualitário de todo ser humano, o setor da mineração declara a valorização das singularidades e individualidades e o respeito à heterogeneidade nas suas diferentes formas: classes, gênero, raça, orientação sexual, deficiências, dentre outras”.

As mineradoras assumem o compromisso de dobrar o número de participação das mulheres no setor mineral até 2030. Empresas com o percentual atual abaixo de 13% devem chegar a 25%; mineradoras com percentual atual entre 13% e 20% devem dobrar esse número; e as organizações que atualmente têm mais de 20% de mulheres no seu quadro de funcionários devem aumentar o percentual para 45%.

Amplamente discutido, o pilar da equidade de gênero ainda tem muitos desafios pela frente. Com base nos indicadores divulgados pela Woman in Mining Brasil (WIM Brasil) em 2021, atualmente apenas 15% da força de trabalho no setor de mineração é ocupada por mulheres. Esse número cai para 11% entre os membros de Conselhos Executivos. 

“Segundo o IBGE, mais de 50% da força de trabalho é feminina. Então o que justifica o número tão baixo  (menor que 20%) das mulheres na mineração? Temos a necessidade de evoluir e amadurecer essas iniciativas, precisamos entender que investimentos precisam ser feitos e essas estratégias precisam se adequar às características das empresas”, pontuou Patrícia Procópio, Diretora do WIM Brasil, durante o encontro do Grupo de Intercâmbio de Experiências de Mineração da Câmara Brasil-Alemanha de São Paulo, realizado em junho de 2022.

Na Alemanha, o cenário se mostra igualmente desafiador. Embora venha ocorrendo um ligeiro aumento na força de trabalho e liderança feminina nos últimos anos, é preciso atuar de forma estratégica a fim de promover mais diversidade no setor. Entre os principais motivos que afastam as mulheres da indústria de mineração estão os modelos de trabalho inflexíveis, diferenças salariais entre os sexos e menos oportunidades de promoção.

“A participação das mulheres no setor energético ainda é baixa, comparável a outras profissões técnicas, especialmente em cargos de gerência. Como as mulheres também estão sub- representadas, especialmente a nível gerencial, em quase todos os outros setores da economia, esta análise não é surpreendente. Para alcançar a igualdade de gênero as mulheres devem ser percebidas com todas as suas qualificações, capacidades e habilidades, independentemente de possíveis planos futuros privados. São necessárias melhores condições estruturais para combinar melhor o emprego remunerado, o trabalho de assistência à família ou mesmo a educação superior, e finalmente, igualdade de direitos, de renda e de oportunidades de carreira”, pontuou Dra. Simone Peter, Presidente da Federação Alemã de Energias Renováveis (BEE).

Além dos desafios relacionados à produção sustentável, o setor de mineração alemão enfrenta adicionalmente a escassez de trabalhadores qualificados, especialmente nas chamadas profissões STEM (da sigla em inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática). Segundo o relatório publicado em maio deste ano pelo Institut der Deutschen Wirtschaft (Instituto Econômico Alemão), a Alemanha precisa atualmente de aproximadamente 320.000 trabalhadores adicionais somente nas profissões STEM. Fomentar a contratação de equipes mais diversas em gênero, origem, raça e idade pode ser um caminho.

Brasil e Alemanha compartilham adicionalmente a insuficiência de dados sobre Diversidade e Inclusão (D&I) específicos para o setor da mineração. Durante a Semana de Diversidade e Inclusão da Mineração do Brasil (Diversibram), realizada em março deste ano, o Diretor-Presidente do IBRAM, Raul Jungmann, anunciou que a direção estuda criar o censo da diversidade do setor mineral. O levantamento tem a pretensão de “acompanhar os avanços e ter conhecimento de tudo o que representa a atenção, o envolvimento, desde a alta administração das empresas até os empregados, com esse tema essencial para a democracia, para cada um e para todos, que é a diversidade”.

Outro pilar de diversidade que tem gerado discussões importantes no segmento é a invisibilidade social que assola as pessoas com deficiências. Mesmo com legislações brasileiras, como o artigo 93 da Lei nº 8.213/91 que determina que toda empresa com 100 funcionários ou mais tenha de 2% a 5% dos seus cargos preenchidos por PcDs, a contratação não garante a inclusão desses colaboradores.

Segundo dados do Relatório Anual de Informações Sociais (RAIS) apenas 1% dos empregos formais em regime CLT são ocupados por PcDs. Já dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que cerca de 17 milhões de pessoas no Brasil apresentam algum tipo de deficiência, o equivalente a 8,4% da população. Os planos de ação se fazem necessários para que a mineração alcance um nível satisfatório na inclusão dessas pessoas.

Pensando em estratégias para solucionar esse problema, a Bosch expandiu seu conceito de diversidade, incluindo equidade e inclusão de modo a criar condições ou oportunidades iguais e promover uma cultura corporativa aberta e confiável, na qual todos se sintam incluídos. Dessa forma, é possível aumentar a consciência das pessoas sobre a diversidade e fornecer um incentivo valioso para novas ideias e abordagens que são essenciais para tornar a empresa cada vez mais bem-sucedida.

“A diversidade não deve aparecer apenas nos valores da empresa, ela deve ser integrada como parte da estratégia, tem que fazer parte da nossa cultura e de todos os nossos processos. Como tema, deve ter tanta importância na agenda quanto o objetivo de atrair novos clientes. É por isso que a Bosch na América Latina definiu metas claras nos últimos anos em relação à diversidade”, explicou Fernando Tourinho, diretor de Recursos Humanos da Bosch América Latina, completando: “A meta [da Bosch] para pessoas com deficiência é de 6% até 2030”.

No Brasil, a empresa é pioneira no tema de diversidade. Em 2018 o projeto Embaixadores da Inclusão e o Caminho da Educação, desenvolvido pela Bosch em Campinas foi um dos vencedores na categoria Gerenciamento do II Prêmio Reconhecimento Global Boas Práticas de Empregabilidade para Trabalhadores com Deficiência, da Organização das Nações Unidas (ONU). O prêmio visa identificar as melhores ações de inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, impulsionando a contratação e a inclusão desses colaboradores por meio da valorizando de suas competências profissionais.

Para as companhias que estão dando seus primeiros passos na construção de políticas de D&I, uma das principais estratégias para fomentar a discussão interna é o desenvolvimento de grupos de diversidade para o fortalecimento da temática e engajamento de todos os níveis hierárquicos. Giovanni Vieira, Gerente de Recursos Humanos da Anglo American, corroborou a importância dessas iniciativas para implementar as iniciativas de D&I traçadas. “Várias ações já foram concretizadas por intermédio desses grupos, como a estruturação de salas de amamentação nas operações; o desenvolvimento de uniformes inclusivos; a extensão da licença maternidade; o censo e a pesquisa de percepção da diversidade e inclusão, entre outras conquistas”, compartilhou.

Contudo, é importante ressaltar que não existe uma fórmula para alcançar um ambiente plural, a construção é progressiva e constante. “Possuímos sistemas e práticas equitativas no local de trabalho. Isso inclui políticas de inclusão e diversidade, combate à violência doméstica, além do nosso código de conduta e da política contra bullying, assédio e retaliação”, exemplificou Vieira. Para ele, as metas para avanços também devem ser estabelecidas de forma clara e objetivas. “Alguns exemplos [das metas] são: até 2023, 33% de mulheres em posição de alta liderança globalmente; e, até o fim de 2022, ampliar a inclusão de pessoas com deficiência para mais de 5%”.

Na busca por um ambiente múltiplo, uma das principais ferramentas é um olhar estratégico não apenas para fora dos portões, mas principalmente para dentro deles, vislumbrando como a companhia pode atuar para que sua estrutura corporativa seja tão diversa quanto a própria sociedade. Criar planos de ação que contemplem todas as camadas sociais, pensando em raça, gênero, orientação sexual, faixa etária, classe social e muitas outras características, é essencial na formação de uma força de trabalho capaz de alcançar os níveis de excelência que somente um ambiente rico em diversidade pode proporcionar.

*Essa matéria faz parte da Revista BrasilAlemanha de Mineração de 2022. Acesse a publicação na íntegra aqui