Skills 4.0

Foto: Divulgação AHK Paraná

Haendel Motta*

Sim, hard skills importam e demonstram a consistência de sua formação. Já a forma como você opera suas ferramentas – se com originalidade, senso crítico, empatia, liderança – revela suas soft skills.

São muito conhecidos esses top 10 skills, elencados pelo Fórum Econômico Mundial:

  1. Complex Problem Solving
  2. Critical Thinking
  3. Creativity
  4. People Management
  5. Coordinating with others
  6. Emotional Intelligence
  7. Judgment and Decision Making
  8. Service Orientation
  9. Negociation
  10. Cognitive Flexibility

Todos concordam que hard e soft skills se complementam, mas no mundo 4.0 não haveria um terceiro eixo de habilidades necessárias? Arriscaria dizer quais são?

Digital skills: intimidade com as novas tecnologias.

Você não precisa se tornar um programador, mas deve ser um usuário digital habilidoso (ainda mais agora, com a aceleração provocada pela pandemia). Respeite seus potenciais e limitações. Não se cobre nas três esferas de skills com igual peso, mas preste atenção: não negligencie nenhuma por completo.

Hard. Soft. Digital.

“As máquinas vão roubar nossos empregos!” – não, aqueles capazes de extrair o melhor delas, ou de se tornar imprescindíveis no que elas não podem fazer é que irão fazer isso.

Habilidades digitais essenciais

Ganhei de um especialista a formidável lista abaixo, de ‘habilidades digitais essenciais‘ (que não ouso traduzir).

Foto: Divulgação AHK Paraná

Os exemplos aqui só pincelam, não esgotam a lista, e focam no básico do dia a dia:

– Então, o HD pifou e foi junto aquele arquivo.

– O quê? Já ouviu falar em nuvem?

– Recebo mil coisas todo dia.

– Separe ‘ruído’ de ‘sinal’ customizando suas notificações e bloqueando o que não interessa.

– Mas isso me isola numa bolha!

– Suporte seu FOMO e, sim, mantenha ativos alguns inputs dissonantes.

– Que montagem legal! Pegou onde?

– Eu que fiz.

– Queria aquele trecho da cena pra postar.

– Em MP4 ou GIF? Faço pra você.

– Socorro, aquela live teve 90 minutos de jogo e só 15 de bola rolando.

– Assisti outra feita em três redes simultâneas, e a pessoa em 30 minutos deu o recado.

– Não aceita cartão? Transfiro agora e envio o comprovante por e-mail, pode ser?

– Cuidado com o que posta, as redes têm olhos, ouvidos e memória longa.

– Não clique em tudo que aparece sem avaliar antes.

E por aí vai!

 

Carreira e anticarreira

Se, antes, as carreiras pareciam seguir um curso linear – por exemplo: estudei por “X” anos, agora é exercer minha profissão por outros “X” e depois me aposentar – sabemos que isso foi mudando de uns tempos pra cá.

Hoje, a perspectiva é de atualização contínua e planos em mais de uma frente de batalha. Mas como isso funciona na prática? Bem, pra começar, não ocupe o tempo integral de sua jornada exercendo o que já sabe fazer – instaure uma cultura de formação contínua. E para a vida toda: lifelong learning.

Se sua empresa ainda não favorece isso, se antecipe, cave-a por você mesmo.

Abra espaço diário para leitura (escreva textos também), assista a palestras, podcasts, inscreva-se em cursos – a pandemia catapultou o ensino a distância, beneficie-se disso. Diversifique seus investimentos de tempo e também os alterne entre estudo e prática – claro, movido pelo que mais lhe atrai fazer.

A questão é que, na dinâmica incerta do mundo 4.0, seu campo de atuação pode desaguar de repente em outro, e depois outro novamente, o que exigirá maior desprendimento e capacidade de adaptação do que nunca.

Joseph Teperman tem um livro sobre isso, o conceitual Anticarreira. Já Nailor Marques Jr sacramenta que “não existem mais formados, estamos todos em formação”.

Profissional T

Já ouviu falar em profissional T-shaped? Se detesta anglicismos (mania de usar termos em inglês), podemos traduzir para “profissional em forma de T”.

No mundo 4.0, interessa o profissional capaz de navegar horizontalmente por áreas diversas sem, no entanto, perder a capacidade de mergulho vertical em pelo menos uma.

Foto: Divulgação AHK Paraná

Isso lembra um T:

  • generalista: espelho de água de grande superfície, dois dedos de profundidade em cada assunto;
  • especialista: poço fundo de água útil, sem notícias do logo ali ao lado;
  • especialista-generalista: espelho de água com um poço no meio.

Hoje, tem vantagem competitiva o especialista-generalista que, como visto antes, alterna prática e estudo em escavações para o lado e para baixo.

Sendo assim, bem-vindo ao mundo 4.0. Ao conseguir, você pode também abrir outros poços, transformando o T em π, ou em ‘m’, ou num pente! Mas vá com calma, saboreie o caminho movido não por ambições externas, mas por significado e flow. Como disse Millôr Fernandes, quem se mata de trabalhar merece mesmo morrer (risos).

As três esferas e suas intersecções (Hard Skills, Soft Skills e Digital Skills):

Foto: Divulgação AHK Paraná

Observe a figura e perceba as interseções entre apenas duas esferas:

  • hard skills consistentes e boas habilidades intra e interpessoais, mas nada além do básico com ferramentas digitais;
  • domínio de hard skills associado a excepcional trânsito por ferramentas digitais, mas um “cavalo” em tato social, baixa intuição e criatividade, universo emocional pouco explorado e instável;
  • habilidade digital formidável e uma simpatia só, nas redes, no trabalho, no happy hour, flexível, empático, generoso. Diplomas foscos ou incompletos, incapaz de passar da página 2 ao discorrer sobre qualquer tema.

Como foi dito, temos que respeitar nossos potenciais e limitações, sem nos cobrar um igual peso nas três esferas de skills. Contudo, dos tipos de carência descritos acima, o que mais preocupa é o terceiro – hard skills.

A velocidade 4.0 parece um impedimento para mergulhos mais profundos – e como os mundos não se substituem, apenas se sobrepõem, manter os olhos no antigo mundo 1.0 também importa muito.

Criar raízes em algo, permanecer até o fim antes de trocar de canal.

O espírito multi-task tem produzido profissionais aparentemente completos, interessantes apenas na superfície dos perfis. Não seja um deles.

Texto Skills 4.0 repostado do linkedIn:

https://www.linkedin.com/pulse/skills-40-haendel-motta

Haendel Motta ministrou a palestra on-line “Fator Humano na Revolução 4.0” na AHK Paraná, no último dia 6 de abril.

 

*Haendel Motta é psicólogo (UFF), pós-graduado em Clínica Psicanalítica (UFF) e mestre em Psicologia Clínica (PUC-RJ). Psicólogo clínico na Marinha do Brasil, pesquisa e produz interfaces entre a clínica psicanalítica e a gestão de pessoas, também atento ao contexto de acelerada transformação atual. Por meio de cursos e palestras realizados em vários estados do país, revisita temas ligados ao fator humano nas instituições através do olhar da psicanálise. Autor do livro “4 Conceitos da Psicanálise para o Mundo Corporativo”, professor convidado do MBI (Master Business Innovation) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).