Seguindo com o propósito de trazer discussões relevantes acerca da proteção e do bem-estar animal, os dois últimos dias do evento Don’t Forget the Animals, 24 e 25 de novembro, tiveram como foco animais silvestres e de laboratório no Brasil e na Alemanha. O evento foi realizado entre os dias 22 e 25 de novembro pela Câmara Brasil-Alemanha de São Paulo (AHK São Paulo) e pelo Instituto Sócio Cultural Brasil-Alemanha com o patrocínio do escritório Pinheiro Neto Advogados. As impressões sobre os dias 22 e 23 de novembro estão disponíveis aqui.
Com moderação do jornalista José Luiz Tejon, o congresso contou com a participação por vídeos-mensagem do Presidente da AHK São Paulo e Presidente da BASF para a América do Sul, Manfredo Rübens; do Embaixador do Brasil na Alemanha, Roberto Jaguaribe; e do Embaixador da Alemanha no Brasil, Heiko Thoms.
São inúmeros os impactos das ações humanas no processo de degradação ambiental, com reações diretas na fauna em todo o planeta. Com relação a isso, o primeiro palestrante do dia dedicado a discutir animais silvestres, José Catão Dias, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zoologia da Universidade de São Paulo (USP), declarou: “A humanidade produz mais de 300 milhões de toneladas de plástico e invariavelmente essas moléculas são carregadas para o oceano, com impactos extensivos a vida marinha.”
Cristiane Schilbach Pizzutto, da Comissão de Bem-estar Animal do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV – SP), alertou sobre as preocupações em se criar animais silvestres em ambientes domésticos. “Ao colocarmos animais silvestres em ambientes artificiais, precisamos entender a capacidade de adaptação a esse ambiente para avaliar a situação de bem-estar do animal”. E concluiu: “Precisamos priorizar como os animais se sentem e pautar nossas decisões partindo desse princípio.”
Sobre o tema “O Bem-Estar em animais selvagens na Alemanha”, Ursula Siebert, da Fundação Universidade de Medicina Veterinária em Hannover (TiHo), comentou os impactos das ações antropogênicas na fauna e apresentou o projeto desenvolvido por ela para minimizar os acidentes com atropelamentos nas rodovias. “Diversos grupos de pesquisa colaboraram conosco para a prevenção de acidentes de animais selvagens, alinhados às tecnologias, criamos um dispositivo que notifica quando animais selvagens se aproximam de rodovias”, disse.
Seguindo com o “Impacto das rodovias na fauna”, Pedro Navas-Suárez, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zoologia da USP, explicou: “A construção de novas rodovias resulta na fragmentação de ecossistemas silvestres. Essa fragmentação acontece hora pelo desmatamento que elimina a possibilidade de vida de algumas espécies, hora por acidentes envolvendo veículos e outros animais, que anteriormente não foram lesados pelo desmatamento”.
Trazendo o panorama alemão sobre o assunto, o Prof. Jörg Hartung, da Fundação Universidade de Medicina Veterinária em Hannover (TiHo), apresentou ferramentas e medidas de prevenção de acidentes nas rodovias, além de indicar projeções sobre danos que uma colisão causaria nos animais e nos humanos. “O que precisamos compreender é que, enquanto os danos para os motoristas são menores, para os animais é quase sempre um dano fatal. Por conta disso, é importante refletirmos sobre quem estamos protegendo com as atuais medidas regulatórias: os animais ou os humanos”, afirmou.
Como um completo prático das apresentações anteriores, Hans-Jörg Schrader, do Ministério do Meio Ambiente da Baixa Saxônia, discorreu sobre as ações que o governo alemão pode tomar para a mitigação de acidentes e danos para os animais. “Se nós não fizermos o nosso trabalho, a própria população tomará providências por conta própria, o que pode acarretar consequências sérias. Por isso, a nossa gestão precisa focar não só nos conflitos, como também nas soluções dos problemas”, explicou.
Os últimos painéis do dia discutiram dois dos principais desafios da proteção de animais aquáticos, bem como as possíveis soluções para resolvê-los. Enquanto a bióloga e Coordenadora de Resgates do Programa de Mamíferos Marinhos da ONG Aquasis, Letícia Gonçalves Pereira, explicou os impactos que o microplástico pode ter na vida dos animais marinhos, a médica veterinária patologista no Instituto Biopesca, Priscilla Costa, apresentou números relativos aos afogamentos de animais marinhos por conta da pesca acidental.
Quarto dia
O último dia do congresso discutiu animais de laboratório pela primeira vez na história do evento. Sandra Wissing, da TiHo Hannover, comentou o papel do “Clinical Skills Lab“ na formação oferecida na instituição. “Os avanços tecnológicos possibilitam experiências artificias muito parecidas com a realidade. Isso beneficia os alunos, que podem aprender com os erros sem consequências aos animais”, explicou.
Julia Maria Matera, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zoologia da USP, explicou a importância da aplicação do uso de métodos alternativos no ensino veterinário do Brasil. “Buscamos criar uma postura dos alunos como futuros profissionais com uma conduta extremamente ética e seguir sempre aprimorando a destreza”, afirmou.
O bem-estar animal precisa ser priorizado em todos os setores. Nesse sentido, Dra. Bettina Bert, explicou o papel do Comitê Nacional de Legislação Animal na Alemanha: identificar a razão e criar normas para impedir o abate de animais de laboratório em excesso. Já Michael Oelgeschläger, do Instituto Federal de Avaliação de Riscos (BfR) apresentou os métodos livres de testes em animais em face da saúde no código do consumidor.
Buscando elucidar as frentes de atuação do Comitê de Ética do Instituto Butantã, especialmente durante o enfretamento do Coronavírus, Maria Leonor Sarno Oliveira, Coordenadora e Membro da Comissão de Ética no Uso de Animais do instituto, explicou detalhadamente o código de ética do Butantã e sua atuação durante a pandemia. Com relação à perspectiva alemã sobre o assunto, Dr. Wolfgang Baumgärtner, do Instituto de Patologia da Fundação Universidade de Medicina Veterinária em Hannover, refletiu sobre métodos alternativos à experimentação animal durante a pandemia e apresentou dados técnicos de estudos relacionados ao tratamento da COVID-19 em animais.
Apresentando o tema “Métodos alternativos a experimentação animal: onde estamos e para onde vamos?”, o professor doutor Paulo Maiorka, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zoologia da USP, defendeu a valorização da ciência como forma de mudar o cenário atual de pesquisas. “Nós precisamos aumentar os órgãos que sejam relacionados à validação dos testes de animais de laboratório, ampliar a fiscalização e, sobretudo, melhorar a educação para a ciência”, disse.
Finalizando o dia, Maria Inês Doria Rossi, Coordenadora de Ensino do Instituto de Ciência e Tecnologia em Biomodelos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), introduziu o conceito dos 3Rs (replacement, reduction e refinement, na sigla em inglês; substituição, redução e refinamento, em português) e traçou uma linha do tempo referente ao uso de animais em pesquisas, desde os primórdios da história até os dias atuais. “O tratamento mais humano dos animais já se provou vantajoso para obtenção de melhores resultados de pesquisas”, definiu.
O encerramento ficou a cargo do Vice-Presidente Executivo da Câmara Brasil-Alemanha de São Paulo, Thomas Timm, que agradeceu o engajamento dos palestrantes e do público, reforçou a importância do tema e convidou para a próxima edição do evento entre os dias 21 e 24 de novembro de 2023.
A edição de 2022 do Don’t Forget the Animals reuniu 280 participantes ao longo de quatro dias. O Congresso contou com o patrocínio do escritório Pinheiro Neto Advogados e com o apoio da Agropecuária Orvalho das Flores, da revista Clínica Veterinária, da Escola Superior de Ecologia Integral, Justiça e Paz Social (EJUSP), da Unesp, da USP e da TiHo Hannover.